Be water my friend. Seja água, amigo. Essa frase do Bruce Lee encaixa direitinho em nosso tempo, apesar de ter sido dita pela primeira vez em meados dos anos 70.
Seja água. Seja mutável, adapte-se.
Todo mundo se prepara para a vitória, mas poucos para a derrota. A cultura da positividade esquece do quanto a vida segue seu rumo, fazendo piada para seus planos.
Muitos me criticam pelo olhar estoico* com que conduzo meus negócios e minha vida.
Mas olha os dias de hoje. Bilionários quebrando, como o caso do Jorge Paulo Leman. Ele foi lider inspiracional para boa parte dos millenials que resolveram empreender. Tem grande chance de você ter lido Sonho Grande e grifado várias sacadas, sonhando no dia que seu primeiro bilhão chegasse.
Hoje, se esconde atrás do vergonhoso caso da Americanas. Virou tipo um ídolo que morreu de overdose.
E o Pão de Açúcar hein? Lá pra 2013, o Abilio Diniz perdeu uma disputa para o então sócio, que decidiu para quem a rede seria vendida. O pão de Açúcar é uma rede de supermercados fundada pelo pai do Abílio, em 1948.
Ele queria que a venda fosse para o Carrefour, mas o sócio dele, Jean Charles Nouri, insistiu que fosse para a rede Casino. Nouri venceu, para desgosto de Abilio, que pouco tempo depois vendeu suas ações na firma fundada pelo próprio pai.
10 anos depois, com uma dívida bilionária, é o Nouri que esta saindo do grupo.
Ainda sobre os Diniz, o filho dele, Pedro Paulo Diniz resolveu viver o sonho de largar tudo e morar na roça (ser herdeiro de uma fortuna é só detalhe, tá, gente). Fundou a Fazenda da Toca, em 2009.
Tocou o negócio durante o boom da alimentação saudável, mas em 2017, quando esse mercado começou a ficar esquisito, encerrou a produção. Flopou e eesolveu mexer com coisa mais graúda, como cultivo de soja (orgânica).
Flávio Augusto, o bilionário mais pop star que conheço, sempre diz: Estabilidade não existe.
O próprio Zuckberg mudou. Antes, tinha aquele estereótipo de nerd, sempre presente em seu QG no Vale do Silício, fazendo pesquisa de clima, mantendo uma certa exposição para marketing pessoal.
Primeiro veio o tiktok pegar uma fatia do seu negócio. Depois, a Apple resolve restringir o rastreamento de atividades, reduzindo drasticamente os resultados de propaganda no Instagram e Facebook.
O fracasso do metaverso, onde investiu muito tempo e dinheiro, junto com a recessão americana, o fez declarar em um programa de entrevistas que gerir o Meta é como levantar todo dia e tomar um soco no estômago.
Eita Markinho!
Ele resolveu mudar. Deixou de ser o líder que a empresa queria, para o gestor que a empresa PRECISAVA.
Be water, my friend! Reage, bora virar água!
Ligou o modo guerra: tomou decisões duras para corte de pessoal, alinhou as expectativas e focou em eficiência.
Zuckberg está com 39 anos. Um a mais que eu, um a menos que meu marido. Sua mudança de comportamento pode ser apenas uma reação a crise, mas também um amadurecimento, uma busca por preencher o vazio.
Num mundo acelerado, a crise da meia idade chega mais cedo.
Liderar e gerir uma empresa, de qualquer tamanho, significa tomar decisões difíceis e desagradar. E quanto maior a crise, mais decisões difíceis e mais impopular é o líder.
Markinho começou sua empresa querendo mudar o mundo. Trangressor, tinha o lema: mova-se rápido e quebre coisas. O facebook de fato mudou o mundo, mas não o comportamento humano.
O tempo passou. Casou-se e passou a valorizar a privacidade, vida em família. Começou a estruturar as coisas na firma, para defender seu legado.
Para acompanhar o mercado, começou a comprar os concorrentes. Quem se recusava a vender, ele copiava. Bora pra frente, cada dia com um pouco menos de fôlego.
Quando a Apple resolveu dar opção aos usuários para que não rastreasse seu comportamento online, Zuck viu seus negócios murcharem. A primeira grande ameaça a seu império. Teve que se adaptar. Tentou criar mecanismos para burlar a restrição, e falhou miseravelmente.
Investiu no metaverso, mudou o nome da empresa. Recebe críticas do quanto suas ferramentas são nocivas para crianças e adultos (sendo estas críticas ironicamente postadas e distribuídas no facebook, Whatsapp e Instagram).
Ele apanhou. Foi abandonado por pessoas de confiança que não compraram seu devaneio chamado metaverso. Cresceu exponencialmente, com uma cultura fraca, e teve que diminuir drasticamente, quando seu maior projeto fracassou.
Seus empregados estão frustados que não tem mais atenção do executivo, não o vêm mais pelo escritório, não participa mais de reuniões periódicas. Mandou todo mundo voltar para o presencial e colocou metas de performance, para o desespero da GenZ.
Consigo até visualizar todos os rostos apáticos pensando na falta que faz a presença do garoto nerd transgressor, mas sem refletirem nas milhões de decisões difíceis que ele tem que tomar em curto período de tempo para não quebrar ou ir em cana.
Tomar decisões é difícil. Tomar decisões difíceis envolvendo pessoas tem outra camada de complexidade. E machuca tanto o dono do pequeno negócio quanto o homem mais poderoso do mundo.
Mark mudou. Está mais velho, cansado, escaldado. Que nem eu e um monte de quarentões por ai. Ninguém nos prepara para as derrotas.
Qual a relação entre Bruce Lee, 3 bilionários brasileiros, a mudança de comportamento do homem mais poderoso do mundo e nossa vidinha mediana?
Bruce Lee responde.
Be water my friend. Seja água, meu amigo. Onde estiver, preencha seu espaço, mas não se limite. Mude seu formato, mude de lugar. Corra para ambientes mais favoráveis.
Porque a única certeza da vida é a impermanência das coisas. E nem aquele que aparenta ter o controle do mundo está imune.
Portanto, por pior que tenha sido seu dia, faça algo em direção a seu objetivo de vida. E tudo bem se um dia esse objetivo deixar de fazer sentido. Be water, my friend.
* O estoicismo é uma corrente filosófica que entende a vida como ela é, com toda sua dureza e imprevisibilidade. O estoico acredita que a única coisa que está em nosso controle é a forma que reagimos a tudo que nos acontece. Sejam períodos bons ou ruins, eles passam – e não devemos nos apegar a eles.